EXTRA: O Ártico e a Amazônia vão ter bebês, VIVA!


A vovó universal, em seus bordejos contínuos, ouviu lamentos conhecidos vindos das bandas de cá e de lá. A vovó diminuiu seu ritmo, ajustou bem a lente de seus olhos, regulou bem a calibragem de seus ouvidos e preparou muito bem seu próprio coração.

Ela também preparou o seu espírito, ô sensível leitor e leitora.

A verdade pode lhe ferir profundamente e a vovó universal pode mesmo morrer e os mundos vão se acabar, para todas as eternidades. Isso depende de nós e dela. Ela sabe muito bem disso e sabe que só mesmo ela pode evitar os fins dos mundos, pois lhe sobra um pouco de tempo, antes de o céu cair para toda a eternidade. O mundo acabaria sim, apenas para a humana idade.

Ela não quer isso, portanto, não vai permitir!
De modo algum ela vai permitir esse fato, esse ato, esse desacato, esse fracasso.
Ela não vai deixar que suas próprias visões se concretizem, que a profecia se realize, que o mal nos vença, assim, tão facilmente.
Ela vem plantar outra semente. Ela já plantou e somos nós mesmos. Para mais essa aventura intergaláctica ela se veste de guerreira. Para a grande batalha pega todas as suas armas de vida e sai feliz para lutar contra a dona morte, sua irmã mais velha. Antes bota todos os seus mistérios dentro de uma bananeira, joga dentro de uma canoa nova e empurra rio acima. A canoa sai da Amazônia e deve lhe encontrar no Ártico.

Ela sai do estado de tristeza inicial. Ela escapa do impacto negativo da primeira visão que temos ao ver o absurdo, o inadmissível. Ao ir, ela já resolveu tudo, mas a luta precisa acontecer pois assim são as questões das naturezas plenas.
Assim são os caminhos para os segredos, inícios de outros sagrados.

Ela se recusou a morrer queimada, afogada, asfixiada ou envenenada.
Vovó se recusou a morrer de fome, sede, frio ou de calor. Assim ela botou todos os seus escudos e foi lutar. Ela preparou outras estruturas para o caso de ter que fugir. Caso precisasse ter que sumir, desintegrar, evaporar, ela foi preparada. Vovó preparou tudo isso e não admitiu tal absurdo, fugiu com o seu povo dos mundos obscuros.

Ela não quis viver essas coisas pois é eterna, está cheia de vida, para dar e para vender. Ela não quis deixar que seus filhos fossem extintos por culpa dos outros. Foi ela mesma que cultivou esses jardins e não esperava de si mesma, outra reação ao vê-los tão cheios de lixo, lixo produzido por humanos, lixos humanos. Lindos humanos imundos, insanos, doentes, cegos e obcecados. Foram sequestrados por entidades do reino da ganância. A missão é resgatá-los e assim foi feito.

Ela se preparou para o pior, mesmo sabendo que ela mesmo é quem decide e sempre decide pelo melhor. Ela sabe, e como bem sabe, deixou mais alguém saber de seu saber, de tais saberes.

Ela então pensou rápido e lançou uma a mais de si mesma para averiguar a situação. Lá em baixo, em cima, daquele e do outro lado, a bolha protetiva do planeta Terra foi inspecionada, limpada, curada, renovada, reinstalada.

Ela é sábia e poderosa, tem todas as artimanhas. Ela passou seu grande Raio-X no universo. Antes, ela passou o seu grande Scanner, sua máquina de fazer “pente fino” no cabelo de sua filha amada, a Terra. A grande e velha mãe quer mesmo ter certeza e curiosa como crianças são, deu uma olhada com atenção justamente para nós.

Mas, vó, nos diga, pois, esquecemos; quem somos nós?

– Filhas, vocês são a ciência, são a demência, a dormência, a potência, a prepotência. Vocês são as armas, as estruturas, as armadilhas, as bênçãos e maldições. Vocês são geniais, são as ARTES!

Viva, vamos ficar felizes, a vovó ouviu nossos lamentos e nós somos nós mesmos – artistas indígenas contemporâneos, em movimento. É isso! Somos isso e estamos no clima de festa, no fim das festas. Estamos sem clima, contudo no clímax, vamos gerar mais vidas.

Somos e estamos férteis. Vivemos em campos hostis, quase estéreis, queremos engravidar e parir. Queremos e podemos dar de mamar e cuidar. Precisamos de mais bebês para o nosso novo mundo. Vó, nos dê mais uma chance, uma nova cosmo-biologia?

– Sim, eu já vou dar a vocês, com algumas condições! Sejam rigorosos com os seus dons e sensibilidades.

Disse a vovó a nos alertar:

– Se cuidem e cuidem! Providenciem esse amor extra. Façam urgente esses bebês minha gente. Vocês são os meus povos, vocês são minha descendência!

Sim, é isso mesmo, ela não está enganada.

As coordenadas mostraram e ainda mostram a nossa agonia. O desespero, o pavor é mesmo grande, foi, está sendo e ainda será. Essa faixa de terras emersas só pode mesmo ser a invisível ligação trans-ancestral entre a grande floresta verde e o grande Ártico e arredores.
São lugares de elevado nível de energia. São sítios mais que sagrados. São segredos de luzes e tons diferentes, temperaturas que se complementam.

Antes disso tudo, vovó já atendeu outros cosmo-geoespaços. Agora tudo parece confuso mais uma vez, mas não está não. Agora só está um pouco mais delicado e ela sabe muito bem sobre catástrofes novas e antigas. Sim, ELA não está caducando ou confusa, ela não está surda ou paranoica. Vovó está atenta e trabalhando muito.

Sim é isso mesmo, ela não está sofrendo vertigem, ela não está sob efeito de remédios, ela não está adoentada. Sim, ela não está drogada ou sendo enganada. Sim, é isso mesmo a verdade, pois ela não está sendo manipulada, ela não está sendo mal assessorada.

Vovó não é mal educada.

Sim, isso é mesmo verdade pois ela não está sendo vítima de nada, como populismos e outros venenos. É tudo mesmo verdade pois ela não foi colonizada e não espera ser canonizada.

Ela não foi capturada ou adestrada pelo neo-liberalismo. Ela não foi abduzida ou induzida a pensar apenas em dinheiro. Ela não tem o desejo incontrolável de construir impérios, de ter muitas coisas. É isso mesmo a verdade, a Vovó universal é quem ouve, sente e vê os efeitos dos imperialismos nas terras onde seus netos viverão para sempre.
É vovó quem fala e sua fala salva essa última geração que está fértil. Ainda há vidas saudáveis para se continuar.

Essa última geração é de genes saudáveis, de gentes guerreiras, como se deve ser. Vovó estacionou sobre nós, deu certo. Ela nos cercou por todos os lados, nos transformou em flor e nos colocou entre seus lábios. Vovó já nos pegou. Vovó já pagou a nossa dívida, nos afagou, nos transmutou, nos elevou e levou.

Vovó universal já nos curou, aconselhou, alimentou, nos derrubou do topo de todas as ilusões. Vovó nos deu visões, previsões, provisões, comunicações. Vovó venceu a luta, mas a luta continua. A luta é contínua pois é assim mesmo.
Vovó deixou mais amor. Ela nos deu um pote de mel e outro de fel para nós temperarmos a vida com equilíbrio. Vovó deixou o vovô, um remo indestrutível. Ela nos aconselhou para que nunca mais saiamos fora de nós mesmos e arrastemos todos para a lama da autodestruição.
O texto continua, a vida continua. Essa “poética” é para a tradução universal. É uma passagem ou uma fina lança invisível daquelas de caçar focas no Ártico, daquelas de caçar macacos no topo das gigantes árvores da Amazônia.

Isso foi escrito pelo tio Jaider Esbell para os anais publicáveis do Simpósio Ártico/Amazônia que iniciou em 2019, em Toronto, no Canadá. Venham parentes (indígenas artistas do Ártico)! Venham ver bem de perto o verde, a vida que há por aqui! Eu estou indo fazer amor com vocês, teremos os nossos bebês!
VIVA triunfamos mais uma vez e foi pelo amor das avós, vamos cuidar!