Abril indígena 2020 – Vamos ouvir as avós


As avós aqui faladas não são as nossas vovozinhas, e são. Não são e são, pois, tem muito mais coisas acima das coisas. Quando a Raquel Blaque (Coletivo Creative commes/SP) lançou lá, a chamada OUVE A VÓ, para benzimentos pela Vó Bernal (Bernaldina José Pedro), mestra anciã das artes gerais do povo Makuxi-RR (Comunidade indígena Maturuca-TIRSS), a mensagem queria e quer dizer muito mais que a primeira intenção. Vejamos onde isso pode dar.

Nós deveríamos estar novamente em São Paulo-SP esse período, com uma acirrada agenda, eu e minha mestra e mãe adotiva, mas tudo foi cancelado. Não ficamos tristes, completamente compreensível para o bem maior das gerações. A Bernaldina hoje está em isolamento social em sua comunidade, a grandiosa Maturuca, coração da nossa reserva a Terra de Makunaimî. Por lá ela deve permanecer até que algo mude para melhor. Claro gostaríamos muito de estar trabalhando no que mais gostamos, praticar partilhando o lado partilhável de nossas culturas. Entre esses saberes está o nosso lado sensível com a cosmologia. Seríamos uma espécie de pajé? E quem é que sabe!

Alertamos e seguimos a alertar em várias formas, por meio de artes que; a urgência em cuidar de nossas vidas coletivas e da mãe-comum a Natureza-Terra era e é, a nossa prioridade zero, ou seja, não temos outra opção. Peregrinamos no “mundo dos brancos” indo muito além de nossas forças para cumprir nossa missão de alertar. GARIMPO NÃO! Andamos bastante e Bernaldina que canta e grita desde sempre, especialmente para nossos próprios parentes indígenas fomos até ao Papa Francisco pedir súplica e oração àquela liderança política e espiritual.

Aparentemente nada do que foi feito por essa mestra de mais de 70 anos e por muitas vozes-vidas que nos antecederam adiantou. Será? Eu espero realmente que não, que tenha adiantado sim. Eu ainda espero que; como nos é garantido em cosmologia, uma voz maior venha nos surpreender positivamente com uma saída possível. Seriam as vozes das outras vovós, ou seja, a Vovó universal.

Centramos nossas dinâmicas em duas linhas gerais basicamente; entregar tudo nas mãos de Deus e negligenciar ou negar a sua existência, debochando da vida como se fosse algo avulso. Arisco por pesquisa prática com a minha própria vida que as duas medidas estão fora de hipótese. Como já diz a palavra popular: “existem muito mais coisas entre os céus e a Terra que possamos imaginar”.

Ouve a vó é uma metáfora, ou uma metalinguagem? Como é mesmo que se diz isso, ô amigues mais preparados com as epistemologias? De onde está Bernaldina, no topo das montanhas de diamantes, com certeza segue fervorosamente em sua fé prática. Ela com toda a certeza conversa diretamente com a vida quando continua a cantar os cânticos ARERUIA do fundo de sua rede, lá pelas duas horas da manhã.

Bernaldina diz com muita clareza: Meus filhos, rezem, cantem e peçam perdão pois Deus Castiga, e muito.

Castigo? Sim, acaba que tudo não deixa de ser uma espécie de, pois quão desatentos somos com o mais elementar de tudo, nosso corpo central e nossa periferia. Recorremos mais uma vez às artes para nos guiar nesse entendimento. Recorramos ao inexplicável para nos auxiliar nessa elevação mínima. O fazer compreendermos nós Senhores e Senhoras da vida plena na Terra que é, com matemática, o universo em si. Tanto céu como inferno, estão dentro de nós e não há porque lamentar se nada fizemos ou fazemos para suspeitar de nós mesmos como parte nisso tudo.
Ouve a vó, é só isso, ouvimos as nossas avós!

Foto: Arte de Daniel Scandura – passo passo Makunima-SP. Projeção a laser no centro de São Paulo por Paulinho Fluxos em parceira com @janelassso.