Exposição EPU-TÎTO – Artes e indígenas hoje – Textos da curadoria


Texto 04 – A ÁRVORE DE TODOS OS SABERES – Painel coletivo
Proposto por Jaider Esbell em 2013, na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – durante a exposição coletiva ¡MIRA! – Artes visuais dos povos indígenas. A coletiva foi uma produção de Maria Inês de Almeida e reuniu artistas indígenas do Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. Cada circulo na grande árvore tem uma assinatura cultural, que identifica um povo específico. O painel tem assinaturas de diversos povos da Amazônia, Américas e Estados Unidos. Em construção, a obra é a primeira de uma coleção de paneis com essa proposta para expor na ONU.
Levar ao mundo a existência de um complexo e próspero processo artístico em criação, portanto inovador entre os indígenas, partindo da Amazônia, é uma das propostas do projeto coletivo A ÁRVORE DE TODOS OS SABERES. Quando buscamos caminhos para a visibilidade midática, buscamos nos apresentar no todo. Buscamos nos conectar a novas redes. Somo diversos e somos comuns; somos vários e somos um só povo com identidades próprias, operando ancestralidades. Somos diversos, somos milhares, somos originários e queremos o espaço ancestral para existir. Existimos, somos daqui e precisamos de espaço garantido para manter a vida plena. A novidade pode não estar na arte. Se faltam argumentos, está, sem dúvida, nos indígenas artistas que lhes conferem o destaque. A árvore de todos os saberes é a arte do dizer existo, também. Dessa forma, a arte para o indígena é o saber e o saber para o indígena é de todos, é do povo onde ele se origina. Os saberes são os poderes dos povos originários. De todo vilipêndio, sobrou muita voz e, com a arte e a mídia, vamos mostrar. Não alheios a rótulos e a comparações, vistos sob o ângulo da natureza incomum, o sistema percebe os artistas indígenas ao falarem sobre suas produções, existindo. Não dissociados do tempo, fazem fluir a transcendência nas obras de arte, por eles materializada. Conscientes, trazem da aparente inconsciência signos completos de conteúdo, o que chamariam abstração. A abstração, neste caso, pode ser requerida em um cruzamento de culturas tão díspares. Há base para sustentar tais argumentos? Sim, há o homem originário, o ser identitário, que representa física e artisticamente aquele povo específico. O ser que registra as expressões inanimadas, aparentemente inexistentes, sem plataformas. O fluir da existência humana na coexistência com os demais seres em ambiente seu. Existir sem sobreposição ou supravalorização deste primeiro aos outros. É terreno até o que não é terra. Pode ser inconcebível para o alheio, o externo. A arte como linguagem está à dianteira nas manifestações culturais, políticas e ideológicas dos mais distintos povos. Pela arte, lugares aparentemente sem conexão possível se conectam. Desde tempos imemoriais, é comum o fazer artístico. Contudo, a arte como conceito e produto com usos e aplicações entre os ameríndios é sem dúvida um fenômeno recente. Há uma novidade no universo já bastante plural das artes, a arte indígena contemporânea, ou a arte produzida por artistas indígenas. Culturas originárias ocupam espaços com a arte. A ocupação de sentidos próprios que a arte dá atende necessidades existenciais. A ligação estabelecida, aprimorada e mantida com o plano espiritual se fortalece. O protagonismo é do indígena, frente à construção desso cenário. A tomada de consciência dos indígenas artistas, ante as possibilidades que o fazer-se visível pode proporcionar a todos, é um avanço. Em franco diálogo, pode proporcionar um conjunto de respostas para perguntas ainda não proferidas. A maneira mais original de fazer arte indígena é fazendo com a vivência, elevando o povo. O indígena e suas habilidades, aprimoradas a cada geração, irrompe na arte contemporânea. Como se se lançasse à uma floresta desconhecida, talvez perigosa, precisa de descobertas. Para além das complexidades interativas ou interpretativas entre arte e artista, da ótica ocidental, arte e índio no romper desse horizonte são a mesma coisa; uma relação que se forma na completude do meio. A diferença está essencialmente no reconhecer-se como tal, um dialogador entre dois tempos. Estando cercado de possibilidades narráveis e ilustráveis dos planos espirituais compartilháveis e acessíveis, trabalha. Está na linha do tempo e alcança tanto quanto se busca. As angústias do agora são amainadas pelo embalo do artista indígena na teia da ancestralidade. O calor da vivência produz a energia que o humano precisa para despertar habilidades a eles conferidas. Em transe com a descoberta de que a arte entre os índios nada mais é que uma forma de diálogo iniciado em tempos remotos. Fielmente viva na memória coletiva e na oralidade, a cultura tem como instrumento o indivíduo artista. Esse diálogo lança-se corpóreo na arte indígena contemporânea. Um campo vasto de estudos está aberto e cresce, o entendimento. A proposta precisa de agência e segue minada de tentações, afeição e artimanhas, que chegam com a nova economia. Somos cultura viva e parecemos produto. Já é entendido que existir exige e, no novo sentido de valor e tempo, nos custa dinheiro. Onde novamente o indígena fascina com a habilidade mantida de nutrir-se de trocas e passo a passo.